Em busca de um modelo de relações 1919-1939 (Parte II)
César de Sousa Mendes, o ministro de Portugal na Polónia desde 1933, reportou a Lisboa principalmente as suas observações sobre as relações da Polónia com a Alemanha e com a União Soviética, tendo em vista a possibilidade de uma nova guerra. Em 1934, houve um desentendimento nas relações entre os dois países causado pela falta de apoio da Polónia a Portugal nas eleições para o Conselho da Sociedade das Nações, apesar das indicações positivas anteriores sobre o assunto; porém esta questão foi rapidamente mitigada. O ministro de Portugal também manteve o Ministério dos Negócios Estrangeiros informado em pormenor sobre as ambições coloniais polacas. Já nos anos 20, circulavam na imprensa e em círculos interessados, ideias sobre a colonização polaca em Angola. Na década de 1930, a Liga Marítima e Colonial liderou uma campanha de propaganda a este respeito relativamente a vários territórios, apontando a sobrepopulação do país, a possibilidade de se conquistarem novos mercados e de se realizar comércio direto e, ainda, a falta da autossuficiência da Polónia no que toca a matérias-primas. No entanto, não produziu resultados significativos — no início dos anos 30, cerca de vinte polacos, incluindo o conde Michał Zamoyski, instalaram-se num planalto na circunscrição civil de Huambo em Angola. Com o passar do tempo, alguns destes colonos regressaram ao país. A imprensa polaca começou a circular informações sobre as possibilidades de emigração em massa para Angola, o que provocou uma reação negativa do governo em Lisboa. Na segunda metade da década de 1930, o Ministério dos Negócios Estrangeiros polaco voltou a sua atenção mais para Moçambique, apoiando discretamente as atividades, entre outros, do doutor em Engenharia Emil Surycz, proprietário de minas de cobre e fazendas na circunscrição civil de Manica. A realização de novos planos foi interrompida pelo estalar da guerra. As exigências coloniais polacas foram seguidas pela Legação de Portugal em Varsóvia, tanto mais que, a partir de 1936, as exigências coloniais alemãs aumentaram, o que poderia ameaçar as possessões portugueses. Era difícil para o ministro de Portugal, Sousa Mendes, discernir as iniciativas apoiadas apenas pela Liga ou de iniciativa privada daquelas que eram também apoiadas pelo governo polaco. O diplomata reagia fortemente quando vozes críticas sobre a política colonial de Portugal surgiam, por vezes, na imprensa polaca.
Nas décadas de 1920 e 1930, a comunidade polaca em Portugal era constituída por cerca de 900 judeus polacos, que representavam principalmente as esferas comerciais de Lisboa e do Porto. O Estado Novo Português despertou algum interesse na Polónia, tanto nos círculos do regime como na oposição conservadora. Houve mesmo contactos oficiais no domínio da propaganda. As relações de cariz científico foram também estabelecidas por esta altura. Já em 1919, Eugeniusz Frankowski, mais tarde um conhecido professor de etnologia, tornara-se membro da Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia e, e no ano seguinte foi o primeiro cidadão polaco a receber uma condecoração portuguesa. Em 1933, o professor Józef Dzierżykraj-Morawski, especialista em literatura ibérica, escreveu que “já é tempo de desvendar as riquezas de Portugal”. Na década de 1930, académicos de ambos os países participaram em congressos internacionais, realizados tanto em Portugal como na Polónia. Foram também desenvolvidos contactos culturais. A Sociedade Polono-Portuguesa foi fundada em Varsóvia em 1930, e a Grupo de Amizade Luso-Polaca em Lisboa iniciou a sua atividade em 1936. Em abril de 1936, graças aos esforços da Legação da Polónia, Artur Rubinstein, o pianista de renome mundial de Łódź, deu um concerto na capital portuguesa. Em ambos os países começaram a aparecer cada vez mais publicações sobre a outra nação. A imprensa polaca fazia uso das correspondências da Agência Telegráfica Polaca. O desenvolvimento das relações foi acompanhado por um interesse crescente acerca dos laços entre polacos e portugueses em épocas passadas. O pioneiro na investigação sobre está área foi o coronel Henrique de Campos Ferreira Lima, diretor de longa data do Arquivo Histórico Militar em Lisboa, secretário-geral da Grupo de Amizade Luso-Polaca, um investigador apaixonado pelos temas polacos e autor de um esboço das relações bilaterais baseado em fontes portuguesas.
Nos primeiros meses de 1939, o ministro de Portugal Sousa Mendes, cada vez mais preocupado, comunicava, de Varsóvia ao ministério, que “a guerra é inevitável”. Em junho, informava que os polacos, apesar de não procurarem um conflito com os alemães, estavam, no entanto, prontos a defender ativamente a sua independência.
LEGENDAS DAS FOTOGRAFIAS
- Cerimónia de colocação da coroa de flores no monumento aos soldados portugueses mortos na Grande Guerra por Karol Dubicz-Penther, ministro da Polónia, na sequência da sua apresentação de cartas credenciais ao presidente da República Portuguesa. Lisboa, 23 de março de 1937. © NAC
- O ministro da Polónia Marian Szumlakowski (sexto a contar da direita) com colegas do Corpo Diplomático durante a cerimónia para desejar votos por ocasião do Ano Novo ao presidente de Portugal, no Palácio de Belém. 1 de janeiro de 1934 © ZMSHY
- Discurso proferido por Tadeusz Romer, ministro da Polónia, a bordo do MS “Piłsudski” durante a cerimónia de entrega de caixas com terra portuguesa destinadas ao monte do falecido marechal Józef Piłsudski em Sowiniec, Cracóvia. Lisboa, 4 de setembro de 1935. © NAC
- O ministro de Portugal César de Sousa Mendes no seu escritório. Varsóvia, 1938. © NAC
- Jantar oferecido por Marian Szumlakowski, ministro da Polónia (de pé, quinto a contar da direita) em honra do coronel Henrique de Campos Ferreira Lima (de pé, sétimo a contar da direita). Lisboa, 12 de julho de 1934. © ANTT
- O ministro de Portugal César de Sousa Mendes (quarto a contar da esquerda) após ter apresentado as suas cartas credenciais ao presidente da República da Polónia. Castelo Real em Varsóvia, 5 de setembro de 1933. © NAC