Em abril passado, a editora Austeria publicou o ensaio Pessoa lizboński [Pessoa lisboeta] da autoria de Andrzej Stanisław Kowalczyk. A publicação faz parte da série “Z rękopisów” [“Dos manuscritos”].

“O que contam os pais dos portugueses quando ouvem a pergunta: “O que é que está além do horizonte?”? Uns dizem, sem dúvida, que lá fica o Brasil, outros lembram-se, sorrindo, da Atlântida. Afinal, cada um de nós tem a sua própria Atlântida, um lugar onde a vida poderia ser totalmente diferente (com um pouco de sorte).

Mas a felicidade é apenas uma ilusão – como diria Fernando Pessoa, que desconfiava das formas de consolação. Parece que ele não precisava dela. Não esperava nada dos seus contemporâneos. Quando viu a sua figura de bronze perto de uma mesinha ao lado do Café Brasileira, no Largo do Chiado, teria ficado surpreso. O tampo  da mesa diante do poeta está vazia – nós queremos que os monumentos sejam abstinentes. Ao lado, nas mesas prosaicas, estão sentados os vivos. Normalmente nem se concentram na vizinhança de Pessoa, às vezes alguém decide aproximar-se para tirar uma foto comemorativa. Ele não parece ser o autor do Livro de Desassossego. Mas será que Marco Aurélio, nos seus monumentos de mármore, parece ser alguém diferente do que césar (mesmo quando sabemos que o papel de césar significava muito para ele)? E o retrato de Montaigne no chapéu – não mostrará sobretudo un gentilhomme français du XVI siècle? A coragem de pensar é tão misteriosa que os retratistas e os escultores ficam desamparados. O autor da figura de Pessoa desistiu e foi uma boa decisão. O mais importante é que o poeta está no centro da sua cidade e diz, citando as palavras do Livro de Desassossego, a todas as pessoas que passam:

«Nunca pretendi ser senão um sonhador. A quem me falou de viver nunca prestei atenção. Pertenci sempre ao que não está onde estou e ao que nunca pude ser»”.

Fernando Pessoa

Fernando Pessoa

É hoje o nome da literatura portuguesa mais reconhecido no mundo. Nasceu a 13 de Junho de 1888, no Largo de São Carlos, em Lisboa. Começou a escrever em criança e fê-lo sobretudo em português, mas também em inglês e francês. Viveu 47 anos e passou grande parte deste tempo a escrever. Considerava que ser poeta e escritor não constitui profissão, mas vocação. Morreu a 30 de Novembro de 1935, em Lisboa, cidade referida em muitos dos seus poemas e cenário do famoso Livro do Desassossego.

Enquanto poeta, escreveu sob diversas personalidades – heterónimos, como Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro –, sendo estes últimos objeto da maior parte dos estudos sobre a sua vida e obra.